A faixa expressa o sentimento de luta dos povos quilombolas
do Maranhão. Geralmente sofrem o engodo dos políticos oportunistas, mas
parecem ter despertado e deixado de ser massa de manobra, passando a
reivindicação de direitos
Processos chegam a durar
décadas. STJ e TRF1 já se posicionaram sobre a possibilidade de fixação,
pelo Poder Judiciário, de prazo razoável para processos de demarcação
de terras
O Ministério Público
Federal (MPF) na 1ª Região, em reiteradas manifestações, pede a
celeridade da Administração Federal nos processos de regularização e
titulação de territórios de comunidades quilombolas, que se arrastam por
anos – em alguns casos décadas -, prejudicando direitos fundamentais
inerentes a essas populações. Violações atacam princípios da
Constituição Federal, entre eles, da legalidade, da eficiência e da
razoável duração do processo e ensejam situações de dano moral coletivo,
indenizações e multas.
É o caso das
comunidades de Lagoa dos Índios, no Amapá, do Alto Trombetas, no Pará,
do Barro Vermelho, no Maranhão, e do Quilombo da Caçandoca, em São
Paulo. Em quatro pareceres distintos, o procurador regional da República
Felício Pontes Jr. destaca a não conclusão dos processos
administrativos de titulação de território quilombola junto ao Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) iniciados há mais de
10 anos e pede celeridade no processo. Para o procurador, a mora da
Administração viola direitos fundamentais da comunidade quilombola, uma
vez que a falta de regularização fundiária impede a aplicação de uma
série de políticas públicas, como saúde e educação, já que são
condicionadas ao reconhecimento territorial, além de impedir a própria
sobrevivência das comunidades.
“É fato que a titulação
de terras quilombolas no Brasil vem caindo vertiginosamente. São raros
os casos nos últimos anos de publicações de RTIDs e de Portarias de
Reconhecimento.” – afirma o procurador, em parecer referente ao Processo
0004405-91.2013.4.01.3902/PA, sobre o procedimento de reconhecimento da
comunidade quilombola de Alto Trombetas (PA) iniciado em 2004. Somente
em 2008 foi constituído um grupo de trabalho para a confecção do
Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), concluído em
2011, pendente, então, apenas a publicação, o que até o momento não
aconteceu.
Situação similar vive a
comunidade quilombola de Lagoa dos Índios (AP) relativo ao processo
0000024-50.2015.4.01.3100/AP. O processo administrativo para a
identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das
terras ocupadas pela comunidade foi instaurado em 2004, sem sua
finalização até a presente data. Segundo o MPF, a omissão do Incra e da
Fundação Cultural Palmares (FCP), envolvidas na ação, é clara violação
aos princípios da legalidade, da eficiência e da razoável duração do
processo (artigos 37, caput, 5º, LXXVIII, da Constituição Federal).
“Essa constatação leva a
população quilombola, no mais das vezes via MPF, buscar um provimento
judicial. Com efeito, a demora na condução dos procedimentos ofende
princípios básicos da Administração pública, em relação a eficiência, a
legalidade e da moralidade, com grave comprometimento do direito
fundamental à duração razoável do processo administrativo”. Segundo
Felício Pontes, nenhum prazo foi respeitado pelo Incra, no caso
concreto, e nos últimos 27 anos, o Instituto concluiu cerca de 3% da
demanda de regularização quilombola. São mais de 1.200 processos
administrativos nos escaninhos da autarquia federal.
Na ação referente a
Lagoa dos Índios (AP), o procurador pede o provimento de recurso do
próprio MPF, para que seja arbitrado dano moral coletivo. A apelação,
interposta pelo Incra e pela FCP, é contra a sentença do primeiro grau
que os condenou na obrigação de concluir o processo administrativo de
delimitação e demarcação da área da comunidade no prazo de 2 anos.
O imbróglio em relação
a titularidade de áreas quilombolas afeta a prestação de serviços
públicos, como acontece com o povoado de Barro Vermelho, no município de
Chapadinha (MA). A União, a Centrais Elétricas Brasileiras S/A e a
Companhia Energética do Maranhão (CEMAR) foram condenadas a adotar
medidas para a implantação do programa Luz para Todos na localidade. Em
apelação, a CEMAR alega que o fornecimento de energia elétrica passa
necessariamente pela regularização da titularidade da área, que
encontra-se em andamento no Incra.
O MPF requereu o
desprovimento da apelação, por entender que a distribuição de energia
elétrica constitui verdadeiro poder-dever da Administração Pública para a
prestação de serviços públicos, devendo adotar as providências que a
lei lhe confere para a efetivação do interesse público.
O Superior Tribunal de
Justiça (STJ) já se posicionou sobre a possibilidade de fixação, pelo
Poder Judiciário, de prazo razoável para que o Poder Executivo proceda à
demarcação de terras indígenas, cujos fundamentos, por analogia, podem
ser aplicados no caso de demarcação de terras quilombolas. E o Tribunal
Regional Federal da 1ª Região (TRF1) já definiu, tendo em vista o caso
do território quilombola de Trombetas (PA) que há necessidade de
determinação de prazo razoável para conclusão do processo.
Entenda o processo de
regularização de territórios quilombolas – O Decreto nº 4.887/03, que
regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos, transferiu do Ministério da
Cultura (Fundação Cultural Palmares) para o Incra a atribuição para a
regularização dessas terras, por meio da Diretoria de Ordenamento da
Estrutura Fundiária, da Coordenação Geral de Regularização de
Territórios Quilombolas (DFQ) e, nas Superintendências Regionais, dos
Serviços de Regularização de Territórios Quilombolas.
Com base na Instrução
Normativa 57, do Incra, de 20 de outubro de 2009, cabe às comunidades
interessadas encaminhar à Superintendência Regional do seu estado uma
solicitação de abertura de procedimento administrativo, apresentando a
Certidão de Registro no Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades
de Quilombos, emitida pela Fundação Cultural Palmares.
A primeira parte dos
trabalhos do Incra consiste na elaboração de um estudo da área,
destinado à confecção do Relatório Técnico de Identificação e
Delimitação (RTID) da terra. Uma segunda etapa é a de recepção, análise e
julgamento de eventuais manifestações de órgãos e entidades públicas e
contestações de interessados. Aprovado em definitivo esse relatório, o
Instituto publica uma portaria de reconhecimento que declara os limites
do território quilombola.
A fase seguinte do
processo administrativo corresponde à regularização fundiária, com
desintrusão de ocupantes não quilombolas mediante desapropriação e/ou
pagamento de indenização e demarcação do território. O processo culmina
com a concessão do título de propriedade à comunidade, que é coletivo,
pró-indiviso e em nome da associação da comunidade da área, registrado
no cartório de imóveis, sem qualquer ônus financeiro para a comunidade
beneficiada.
Assessoria de Comunicação
Procuradoria Regional da República da 1ª Região
Procuradoria Regional da República da 1ª Região
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